Era a minha morte...
relembras-te? quando de olhar perdido
te dizia o quanto te amava
embora para ti fosse apenas
esquecimento
um simples gesto na esteira
de uma perpétua memória
desejando da lingua fere em fúria
dos corpos adormecidos de desejo
e no fim uma terna solidão
e quando te abandonas-te ao ensejo
vi em teus olhos ser tão certo assim
que de tudo o que vimos foi glória
de um mundo que se abria para nós
e de tudo o que foi e será
compreendia a ilusão que morria em ti
quando o que querias era a paz
mas essa em ti morria assim
e fundiu-se o poema que sem mar
era apenas marés de um terno compasso
cuja música surgia adormecida
na nossa triste despedida...
terça-feira, 17 de junho de 2014
terça-feira, 27 de maio de 2014
Meu amor
Prosa Poética
“
Ai como dói o meu coração, na esperança
de ver teu rosto. Vivo na ilusão de ser disposto, e tu meu amor, que
cravejas-te uma seta no meu peito alado, que perpetuas-te as palavras
indefinidas do amor, sem correspondência. Poetisa do meu coração. Leio na tua
boca, quando os teus lábios fecham, todos os murmúrios do mundo. E o dia é o
amanha, sem dia, sem tempo, apenas o infinito, apenas o tormento, de não poder
ver a tua face cândida de prazer. E assim sinto-me morrer. Morro mesmo, quando
o teu olhar cruza o meu. Quando na ilusão tento escutar o teu coração. No
momento em que evocas a recordação, para que nela ressurjas na tua sombra. Alma
perdida. Vazio profundo. Eterna ferida. Solidão do teu mundo. Ele sangra,
sangra, e é o teu abraço que o conforta. Nele forte te tornas para a tua força
não fraquejar, minha musa. Tu que viajas no murmúrio do tempo, que ouves o som
dos pássaros e presentes o som da cor do mar. Confessa a ilusão que percorre o
teu tempo. Sendo tempo de avançar. E a areia molhada que te colhe na sua
imensidão, cujas ondas se perdem, na nossa outrora paixão. Perdida.
Desaparecida. Que te afogam e não te deixam respirar. A cada mergulho nesse
abismo onde te sentes desmaiar. Adormecida no leito do teu sono, abraçado no
teu ser profundo. Renegas todas as cordialidades, ansiando apenas por um só
momento. Desse teu fogo. Do teu alento. Que por momentos te traz consolo. No
firmamento. Mas a inquietação persegue-te. Lembra-te o poema maldito. Da cinza
do mundo que nem a tua poesia consegue afastar. De ti, e tu perdida de ti meu
amor, perdida. Nesse teu abraço teu, que te abraça na solidão. Vejo as sombras
a percorrer as paredes. Os sonhos que te trazem as folhas das páginas despidas.
Tu que te perdes e te encontras nas letras de um livro. Nas letras mortas e
fecundas. Que te perseguem em sonhos. Quando no limbo te sentes cair. Desmaiada
de toda a tua condição de mulher. Como se a maldição fosse o seres sensível. E
tu que assim vives nessa ilusão, de mais um momento vazio, onde o prazer que te
sobra é apenas um breve abrigo, ocupando apenas um instante de solidão. Volta
para os teus sonhos, sombra que amaldiçoas a solidão. Que quem sabe um dia te
fez sentir assim. Tão perto de ti. E tão longe, ou perto, e tão perto do longe
do mundo, não sei ao certo. Comungamos dessas palavras vagas de poesia, com a
frieza que esconde o teu coração. Já te tinha um dia dito, sem o saber. Sem
saber a firmeza das palavras escolhidas. Diria o mestre sacrilégio, e
baptizaria com os beijos ternos. Essa mistura de amor perdido em mim. Sombra
fugaz que surges nos meus sonhos. Perdida de ti para te encontrares em mim.
Sendo a verdadeira poesia o amor, que nada mais é agora do que uma simples
mensagem, da inocência das palavras. Que um dia foram tuas, e que para sempre
estarão nesse cantinho onde procurares por elas. As palavras que caminham no
passado, pois o tempo não recorda lugares. É um fogo extinto que arde sem
razão. Ao que outrora esse teu olhar me disse. Vago. Distante. Solidão de
viajante. Como a quem o mundo abraçou e te ofereceu, um qualquer lugar no
mundo. É esse o meu destino. O universo. Do infinito. De onde um dia parti,
para agora nas palavras compreender. Que sempre ali estive, e sempre ali morri.
Sozinho no meu sítio sagrado. Vazio de toda a certeza, sendo a vacuidade que me
transporta para a minha eterna pureza. Como puro é o meu amor por ti, meu amor,
minha dor. "
sexta-feira, 16 de maio de 2014
Texto de escrita criativa
Estavam no quarto
nº18, como indicava na placa em cima da porta rugosa. A luz do hall iluminava
mal a entrada da mesma. Era de uma cor violeta que incidia sobre os seus rostos
fazendo-os ter uma idade que não aparentavam. O som do quarto ao lado era
nítido de uma televisão ligada num canal qualquer. Talvez o canal de vendas que
tentaria vender qualquer produto fazendo companhia a quem estivesse acordado
aquela hora.
- Entramos?
Entraram. O acesso
era feito através de um cartão de plástico que se inseria sobre a ranhura da
porta.
O quarto estava
sereno e limpo. Inspirava um traço melancólico e as camas estavam feitas. Os
lençóis alinhados sobre a cama de cor branca tinham por cima uma manta que se
sobrepunha com um aspeto antigo com uns bordados à mão. Um quadro à frente da
cama mostrava a imagem de um homem solitário com um cachimbo na boca como se
fumasse para esquecer a sua dor.
Num dos cantos do
quarto estavam duas malas feitas. As paredes transpiravam saudade. A mesma saudade
que demonstrava os rostos do Sr. A (assim o vou chamar) e da Sra. B.
Aproximaram-se e
murmuraram algo ao ouvido que não foi inteligível. Deram um longo abraço. O
olhar do Sr. A transparecia a cumplicidade que nutria pela Sra. B, o que
evidenciava uma relação de longa data. Sentaram-se em cima da cama e
abraçaram-se novamente. Foi evidente o sorriso que Sr.A fez para a Sra. B que o
abraçava efusivo.
- Sabes que eu gosto
de ajudar os outros. Podes contar comigo.
Disse-lhe ao ouvido
esboçando um ligeiro sorriso.
E isso era
perentório na relação que parecia existir entre aquele casal. Mas seriam um
casal? O narrador imiscuísse dessa tese, quando o Sr. A pegou na sua aliança e
a poisou em cima da mesa-de-cabeceira. Talvez fossem meros amantes que se encontrariam
ali como noutro quarto qualquer.
- Sabes que não
devia estar aqui contigo. Disse Sra. B para o Sr. A que a tentava agarrar sobre
a cintura. Num acesso involuntário afastou-se dele e murmurou ao leve numa voz
que ecoou sobre o quarto num pranto melancólico.
- Não devia mesmo
estar aqui contigo.
O Sr.A tolerou esse
afastamento e levantou-se abrindo a persiana do quarto, que deteve-se imóvel
enquanto entravam os primeiros raios da manhã. Era a madrugada que se anunciava
pelos pequenos fios de luz que brotavam do exterior.
- Sabes que não
devia estar aqui contigo.
A aliança brilhando
sobre a mesa-de-cabeceira ao pé do cartão chave que abria a porta, e o mesmo
som do televisor ligado do quarto ao lado no canal de vendas.
- Mas estás! Quer
dizer qualquer coisa. Disse o Sr.A para a Sr. B que se deteve olhando um postal
que estava em cima da mesa da entrada, bem em frente à cama, com uma imagem de
uma porta luminosa que parecia abrir-se á luz que se sentia do exterior.
- Quer dizer
qualquer coisa. Repetiu baixinho enquanto lhe olhava o rosto terno e simpático,
um pouco pálido do enunciar da hora.
Sra. B sentiu-se
vulnerável aquele pedido. Olhou de relance para as malas feitas junto à porta.
Uma delas chamando por si, como se fosse uma despedida.
- Dançamos, bebemos
um pouco demais e agora queres ir embora. Disse o Sr.A enquanto olhava para a
Sra. B reparando que se aproximava das malas.
- Isto tudo
parece-me errado. Murmurou a Sra. B.
E o som do televisor
que se parecia ter desligado por momentos, fazendo sobressair a sua voz cândida
com medo de pronunciar aquelas palavras.
- Talvez seja
errado. Disse o Sr.A olhando para a sua aliança perdida em cima da
mesa-de-cabeceira ponderando bem a sua decisão. – Mas sabes bem como não gosto
de ser contrariado.
Acendeu um cigarro
que puxou numa passa mais prolongada fazendo incidir a luz da ponta no escuro
do quarto que apenas se iluminava pela luz ténue que surgia da janela.
- E tu sabes que eu
sou tolerante. Respondeu a Sra.B aquela frase.
- Podes contar
comigo. Repetiu o Sr.A olhando nos seus olhos e puxando mais uma passa do
cigarro.
- E sabes que não
podes fumar aqui.
Ele olhou
profundamente nos seus olhos e disse.
- Se quiseres ir
vai. Não te forço mais. E dirigiu-se à mesa-de-cabeceira colocando novamente a
aliança no dedo como sinal de partida.
Sra. B olhou para
ele e pegou nas malas.
- Vemo-nos por aí. E
partiu deixando a porta aberta, uma porta escancarada como um prenúncio do
mundo.
terça-feira, 1 de abril de 2014
Alguem
Alguem te chama
para alem das sombras da manha
quando os raios
se perpetuam na madrugada
Alguem te quer
imersa nos teus sonhos
quanto deles te soam
incolumes
E quem te clama
de olhar perdido
na bruma de um
horizonte esquecido
Quem te chama
para alem
de um lugar
esquecido
e quem te deseja assim
com rios de laivos de loucura
quando o tempo
é uma tortura
para alem das sombras da manha
quando os raios
se perpetuam na madrugada
Alguem te quer
imersa nos teus sonhos
quanto deles te soam
incolumes
E quem te clama
de olhar perdido
na bruma de um
horizonte esquecido
Quem te chama
para alem
de um lugar
esquecido
e quem te deseja assim
com rios de laivos de loucura
quando o tempo
é uma tortura
A dor de amar-te assim
Poema: A dor de amar-te assim
Queria amar-te
para além das pétalas
das palavras
Para além do sol
e do mar
e despojar-te na areia humedecida
do teu olhar
perdido em mim
E nessa forma
encontrar-me no teu seio
que se despreende
em teu olhar modesto
vida de incesto
na despedida
de mais um gesto
e quando na madrugada
vieres à minha procura
sou anjo que se arrasta
na deambulação do desejo
perdido
para me encontrar
no teu jardim
Dou por mim
escondido
numa teia de cetim
imaculada pelo firmamento
do céu
em teu interior
que é manifesto
da minha imensa
dor.
Queria amar-te
para além das pétalas
das palavras
Para além do sol
e do mar
e despojar-te na areia humedecida
do teu olhar
perdido em mim
E nessa forma
encontrar-me no teu seio
que se despreende
em teu olhar modesto
vida de incesto
na despedida
de mais um gesto
e quando na madrugada
vieres à minha procura
sou anjo que se arrasta
na deambulação do desejo
perdido
para me encontrar
no teu jardim
Dou por mim
escondido
numa teia de cetim
imaculada pelo firmamento
do céu
em teu interior
que é manifesto
da minha imensa
dor.
segunda-feira, 31 de março de 2014
Do amor
Poema: Do amor
Queria despir-te
com as mãos
ausentes de sentido
tu que és minha vida
que se revela
tu comigo
Da flor que
brota em teu
deserto
cujo corpo
é em ti meu
manifesto
para em ti
repousarmos
nos laços de um só
conjugação
de um verso
na forma de poema
despida
no sentir
de mim reflectida
Para sempre
tu em mim
seres minha vida.
Queria despir-te
com as mãos
ausentes de sentido
tu que és minha vida
que se revela
tu comigo
Da flor que
brota em teu
deserto
cujo corpo
é em ti meu
manifesto
para em ti
repousarmos
nos laços de um só
conjugação
de um verso
na forma de poema
despida
no sentir
de mim reflectida
Para sempre
tu em mim
seres minha vida.
Tu
Poema: Tu
Tu , que surges para alem da noite
num sentir que vem povoar todas as sombras
que acalentam esta forma de pensar
como se fosse apenas um pressentimento
E quando da noite se faz voz
ecoando para lá da solidão
surges de véu escondendo tua essência
para deambulares na tua premencia
E de tudo o que é assim sentido
para alem de estares tu assim comigo
do gesto que me faz sonhar assim
como se fosse um mar da eterna luz cetim
Tu , que surges para alem da noite
num sentir que vem povoar todas as sombras
que acalentam esta forma de pensar
como se fosse apenas um pressentimento
E quando da noite se faz voz
ecoando para lá da solidão
surges de véu escondendo tua essência
para deambulares na tua premencia
E de tudo o que é assim sentido
para alem de estares tu assim comigo
do gesto que me faz sonhar assim
como se fosse um mar da eterna luz cetim
Constelações no céu púrpuro
Poema: Constelações no céu púrpuro
Surgem sombras
no há-de vir
como uma cortina de fumo
do meu eterno sentir
E nessa deambulação
são cravos despovoados
no meu coração
amargurado
Que se ressente de
toda a ilusão
de um dia
que surge para além da noite
E nessas incertezas
de mãos despidas de ternura
somos constelações
na escuridão de um céu púrpuro
E depreendesse o véu
e todo o teu corpo é meu.
Surgem sombras
no há-de vir
como uma cortina de fumo
do meu eterno sentir
E nessa deambulação
são cravos despovoados
no meu coração
amargurado
Que se ressente de
toda a ilusão
de um dia
que surge para além da noite
E nessas incertezas
de mãos despidas de ternura
somos constelações
na escuridão de um céu púrpuro
E depreendesse o véu
e todo o teu corpo é meu.
Sitio
Poema: Sitio
Aqui neste sitio onde te vejo
de um lugar povoado de sombras
em que a vida se conforma
com o deambular da solidão
e nesse pensamento
quantos vidas serão tormento
quantos passos que se dirigem á tua aura
que brilha no mar do sentimento
e quando assim
se tomar a veia em mim
sou trajecto oblíquo
que cruza só o horizonte
para onde convergem todas as sombras
de um sitio abandonado
que circula no teu olhar
e que migra para o sol posto.
Aqui neste sitio onde te vejo
de um lugar povoado de sombras
em que a vida se conforma
com o deambular da solidão
e nesse pensamento
quantos vidas serão tormento
quantos passos que se dirigem á tua aura
que brilha no mar do sentimento
e quando assim
se tomar a veia em mim
sou trajecto oblíquo
que cruza só o horizonte
para onde convergem todas as sombras
de um sitio abandonado
que circula no teu olhar
e que migra para o sol posto.
Alguem do outrolado
Alguem do outro lado
chama por ti em terna voz
para além do firmamento
perdido que há em nós
E nesse descernimento
de meras sombras te povoam
um olhar amanhecido
de um grito além perdido
E quando em ti
se firmam horizontes
somos nós
astros de rejubilo
Que percorrem os céus despidos
nessas deambulações
acordam nos teus sonhos
de nossos corações
chama por ti em terna voz
para além do firmamento
perdido que há em nós
E nesse descernimento
de meras sombras te povoam
um olhar amanhecido
de um grito além perdido
E quando em ti
se firmam horizontes
somos nós
astros de rejubilo
Que percorrem os céus despidos
nessas deambulações
acordam nos teus sonhos
de nossos corações
sexta-feira, 28 de março de 2014
A morte anunciada de Malena
A
escuridão da alma pode ser tão perturbadora como a morte de uma criança. Ela
estava a morrer. Uma morte lenta que lhe retirava a vida a cada célula. A
impotência de seus pais que a viam deitada no leito à espera da morte convergia
para o desespero. Uma impotência de que sabiam qual a origem e lhes apertava o coração
com uma melancolia agras que parecia despertar neles o medo do desconhecido. O
seu rosto frágil, de olhos profundos de dor, cavados e negros que só com a
morfina parecia fazer desaparecer, indiciava uma alma combalida, mas certa
quanto ao desfecho nesta vida. Estranho destino que se cingia sobre os ombros
leves daquela criança, com o peso da idade terna de apenas seis anos de idade,
mas tão segura de si quanto ao que lhe iria acontecer no futuro. Com uma força
desmedida parecia acalentar o coração de seus pais com as palavras certas,
dizendo-lhes que tudo iria correr bem, e que no futuro no além um anjo a
pegaria ao colo e a levaria ao encontro de outras crianças. Assim, adormecida
profundamente, cingia-se em si de um pequeno peso de alma, que se intricava na
sua vida presa por um fio. Doutor, deveremos ter esperança quanto ao destino de
nossa filha? Perguntava o pai da criança ainda um pouco apático face aquela
situação em que tinha mergulhado a sua vida. O médico de olhos baixos em
direcção ao vazio, e sem lhe poupar qualquer esperança, dizia que era melhor
contar com o pior, pois a situação de Malena piorava a cada dia que passava. Nem
a quimioterapia parecia melhorar a sua situação. Assim, ligada a uma máquina
que lhe injectava pequenas doses de remédio, para lhe reduzir as dores, Malena
que morria com um cancro que se tinha expandido por todo o seu corpo, sonhava
que subia umas escadas, uma a uma, cujos degraus a levariam para um lugar que
lhe mais parecia com o céu, e onde ela poderia brincar com as outras crianças
que como ela, Deus havia levado para esse destino Os olhos de sua mãe
inundavam-se de lágrimas, mas chorava silenciosamente sem que a pequena se
apercebesse, pois era naquele momento apenas impotência que sentia por não
poder ajudar a sua filha. Os dias iam passando, e o quarto de hospital onde a
criança estava internada enchia-se de flores que as visitas iam trazendo. Eram
magnólias, lírios, uma orquídea branca que se cingiam às paredes do quarto de
um azul celeste. Apesar de tudo, essas bonitas plantas alegravam o quarto e
decoravam o ambiente. E ao respirar esse ar, com o cheiro que as flores
transmitiam, Malena parecia imergir num pequeno jardim onde a morte a viria
buscar no futuro. Olá, eu sou a morte, e venho-te buscar para poderes brincar
com os outros meninos, dizia-lhe uma voz que não a perturbava, mas que a
acalentava em relação a um futuro mais risonho que estaria à sua espera. Eu sou
a Malena, e nunca imaginei que a morte tivesse a forma de um anjo, daqueles que
se vê nos livros de desenhos, com largas asas púrpuras de um branco
transparente, tal asas de andorinha. Pois, mas eu sou uma morte especial,
aquela que recebe pequenas crianças como tu no seu leito. E Malena sonhava com
esse desfecho em que ao subir as escadas com a morte de mão dada, iria ser
recebida por muitos meninos que com ela festejariam as mais belas brincadeiras,
correndo por esse jardim, que mais se assemelhava ao seu quarto de hospital. E
nesses momentos, o seu pai perguntava com quem estava a falar a criança. Ela
que se remetia a si num diálogo surreal que parecia ser motivado pelas pequenas
doses do remédio que lhe era administrado. Com a morte, papá. Respondia a
menina. Ela disse-me que me virá buscar com ela para irmos brincar com os
outros meninos. E os olhos de seu pai enchiam-se de lágrimas, pois a morte não
pouparia a vida de sua filha nem o que ela tinha de melhor à presença de seus
pais. E se ele pudesse fazer um pacto com a mesma, talvez lhe dissesse para o
levar antes com ela, e poupar a vida de sua menina, que de tão frágil nem se
apercebia do seu desespero. Mas a morte não poupa ninguém. O destino já está
escrito nas estrelas e apenas o que pode acontecer é o prolongar de uma
situação que será inevitável. Mas se ele pudesse prolongar aquele estado,
talvez estivesse a ser egoísta pois as dores no corpo de Malena tornavam-se
insuportáveis, e o melhor mesmo é que a morte a levasse com ela para o outro
lado e lhe poupasse todo esse sofrimento.
Naquele
dia o vento soprava irresoluto sobre as cortinas do quarto de hospital e os
seus pais encontraram-na adormecida num sonho profundo. Os seus olhos negros
por detrás das pálpebras que se agitavam levemente faziam-na sonhar com o além,
onde os meninos brincavam com os seus papagaios de papel numa colina de um
monte verdejante, e sob um céu muito azul, calmo e sereno, onde ela se
encontraria para seu rejúbilo. O seu pai aproxima-se de Malena e segreda-lhe ao
ouvido para ela acordar, e os seus olhos abrem-se de mansinho. Já era dia, e
apesar do vento gélido que parecia querer entrar pelas frestas da janela do seu
quarto de hospital, ela acordou imersa desse sonho que sempre sonhava quando
dormia à noite. O papá e a mamã tem um segredo para te contar. Disse o pai à
criança. Olá papa, bom dia. Foram as suas palavras, uma vez que acordara
levemente e parecia querer despertar daquele sonho da última noite. Vais ter um
irmãozinho. Respondeu-lhe o pai. A mãe olhava para ela com olhos de ternura, e
agora que o seu fim estava próximo, Malena ia ter um irmão, pois a sua mãe
estava grávida. A criança alegrou-se com aquela revelação, e abraçou os pais
com grande furor. Ia ter um irmão, e estava radiosa com aquela constatação. Que
alegria imensa em ter um bebé com quem brincar. Então levantaram-na com cuidado
e sentaram-na num sofá que existia ao lado da sua cama que ficava encostada a
uma das paredes laterais do quarto. O papá comprou este livro de desenhos para
a menina. Tem uma bela história. Disse-lhe o pai. E que história é essa.
Conte-a papá, conte-a! Exclamou a menina que se havia sentado no sofá e que
agora desperta se alegrava com o seu novo livro de histórias. É sobre uma
menina que ia ter um irmãozinho. Começou o pai a contar a história. Certo dia,
veio a cegonha no céu e trouxe o bebé enrolado num xaile branco, semelhante a
uma manta de retalhos de um branco muito branco. E o bebé chorava fazendo: uá
uá! Continuou o pai a contar a história. A irmã que o veio receber dos braços
da cegonha, uma vez que os pais não estavam em casa, não sabia o que fazer.
Então, pegou num biberão e deu-lhe leitinho para ele beber. Mas ele continuava
a chorar. E então o que ela fez papá!? Perguntou a criança entusiasmada com a
história. Então a criança pegou-a ao colo e começou a embalá-lo e a cantar uma
música.
“
Era uma vez um bebé, muito fofinho, que dormia no seu cantinho.”
Cantava
a criança. E o bebé começou a ficar embalado e adormeceu num sono profundo, e
não mais chorou e ficou muito sossegado. Que bela história papá! Exclamou a
criança enquanto olhava para as figuras do livro. Sabes papá, estou cansada.
Disse a menina, e então o pai deitou-a novamente na cama. E os dias foram
passando.
No
dia em que Malena morreu, a sua mãe entrou em trabalho de parto no hospital.
Foi como se a sua alma migrasse para o corpo do recém-nascido. Não sei se isso
será possível, mas assim pensaram os seus pais, que vendo Malena partir, agora
tinham nas suas mãos um bebé frágil. E a partir daquele dia, assim contou a
história que as primeiras palavras que ele disse quando aprendeu a falar, foram
do nome da sua falecida irmã, Malena, para espanto dos seus pais.
segunda-feira, 24 de março de 2014
Mocho Sabichão
As aulas do mocho
sabichão eram sempre muito alegres e divertidas. O mocho arranjava sempre
esquemas para explicar aos animais do bosque a gramática do estudo da língua
humana. Eles aprendiam essa língua para que na floresta mágica pudessem falar o
humanés, que era o nome dado a língua falada pelos humanos. E eram tão
divertidas, tão divertidas que todos eles se fartavam de rir quando o mocho
contava as suas histórias.
As aulas eram
lecionadas no terreiro junto ao largo das laranjeiras, no meio do bosque. Os
troncos velhos de árvores já caídas da floresta serviam de mesa e cadeiras para
que eles se pudessem sentar. Por outro lado, as notas eram escritas em pedaços de
papel de sebenta que o mocho sabichão tinha comprado na loja da Dona Raposa,
que vendia material escolar para os habitantes da floresta. A Dona Raposa tinha
um franchising desse género de
produtos. Por outro lado, já se tinha internacionalizado para outras zonas da
floresta, tendo um negócio muito lucrativo na venda de material escolar. Isso
devia-se ao facto de os animais terem muita vontade de aprender o humanés.
Certo dia, o mocho resolveu explicar os substantivos coletivos, que era o nome
dado aos nomes que indicavam uma pluralidade de seres da mesma espécie, ou uma
coleção.
- Olá meus caros
bom dia! Exclamou o mocho dirigindo-se à plateia de animais. – Hoje iremos
falar dos substantivos coletivos!
- O que é isso, o
que é isso? Perguntou o sapo lá ao longe, que estava sentado na terceira fila e
fazia muito barulho a mastigar uma pastilha.
- Bem, é isso que
vos vou explicar. Os substantivos coletivos são…
De repente é
interrompido pelo papagaio que tinha chegado atrasado á aula.
- Desculpe o
atraso professor mocho, mas estive a tratar de uma tradução de língua humaneza.
Desculpe o atraso. O papagaio era um dos melhores alunos da aula e já fazia
traduções do humanés.
- Não faz mal, não
faz mal! Como eu estava a dizer… continua o mocho quando é interrompido
novamente, agora pela coruja.
- Piu professor
mocho. Quantos tipos de substantivos é que existem hem? Disse a coruja com um
piar ligeiramente rouco porque andava mal da garganta, e já tinha tomado
pastilhas para a tosse.
- Bem, já que
pergunta são… Ia dizer o mocho quando é interrompido novamente pelo jacaré que
pergunta.
- Professor mocho,
posso ir à casa de banho, posso?
Finalmente o mocho
diz.
- Podes ir sim,
mas se me continuam a interromper não vou poder explicar os substantivos coletivos…
- Desculpe
professor mocho. Diz a Iguana interrompendo-o novamente. – Mas você hoje não ia
explicar os adjetivos. Como era mesmo… O sotaque da iguana era meio abrasileirado
e ela falava com a língua em s. Assims, e por ai adiante.
- Não dona iguana,
hoje irei explicar os…
É novamente
interrompido pelo leão, que faz um longo rugido.
- Grrrr…. Desculpe
professor mocho, é o meu estomago a rugir, porque hoje ainda não comi nada.
E o professor
mocho lá teve que fazer uma pausa para os animais irem tomar o pequeno-almoço.
Passado um quarto
de hora, o professor mocho chama novamente os animais da floresta.
- Venham meninos
que tenho de explicar-vos os substantivos coletivos.
E os animais
entraram de mansinho na aula á espera da explicação do professor.
- Professor mocho
conte uma história, conte! Por favor. Disse baixinho o periquito que se
encontrava sentado num ramo de uma árvore.
- Bem está bem, eu
conto, mas só se tiverem muito quietinhos. Exclamou o mocho com uma voz
ternurenta.
- Nos ficamos
muito, muito quietinhos. Respondeu o gato que se encontrava cheio de atenção
sentado no tronco da primeira fila.
- Então é assim.
Começa o mocho. Eu conto se me disserem quantos substantivos coletivos
encontram na história.
- E o que são os
substantivos coletivos. Perguntou novamente o gato.
- São os nomes que
indicam uma pluralidade de seres da mesma espécie ou uma coleção.
- Muito bem.
Responde o leão, que já tinha tomado o pequeno-almoço e se sentia com o
estomago aconchegado.
- Era uma vez um humano
que tinha uma voz muito grossa e falava axim. Certo dia, no meio da multidão
havia um cego que pedia esmola. O homem aproximou-se dele e deu-lhe uma moeda
de um euro. O cego perguntou-lhe se ele tinha boa visão, porque a dele era
turva e só conseguia ver sombras à sua frente. Tinha pena de ser assim, porque
não podia ver as estrelas no céu, nem olhar para o mar. O homem perguntou-lhe.
É cego há muito tempo? E o cego respondeu que tinha cegado já era um rapazote,
mas que ainda permanecia em si a lembrança de ver as constelações no céu à
noite. O homem que falava axim, teve muita pena do cego e sentou-se a seu lado.
Descreva-me o mar. Perguntou o cego ao homem. O homem respondeu que o mar era
como pintar o céu de um azul brilhante e que o imaginasse com uma palete de
cores cinzenta, quando caia a noite no céu. Deve ser uma visão muito linda.
Exclamou o cego. De facto assim o era, mas ele não podia ver, nem as suas
palavras podiam descrever a beleza daquela paisagem.
Os animais estavam
fascinados com a história do mocho e interromperam-no para dizer-lhe que
palavras representavam os substantivos coletivos.
O leão começou.
- A palavra
multidão é um substantivo coletivo senhor professor mocho?
- É sim! Muito bem
visto leão! Exclamou o mocho.
- E a palavra constelações?
Perguntou o papagaio que ouvira a história com atenção.
- É sim senhor,
muito bem papagaio.
- A palavra palete
também o é? Perguntou o jacaré.
- Sim senhor,
também é! Exclamou novamente o mocho.
E ficando contente
por os animais terem adivinhado os substantivos coletivos, distribuiu rebuçados
de mentol por todos eles. A lição tinha sido um sucesso.
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